Prefácio do livro Pentecostalismo e Pós-Modernidade

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Estimado leitor, tens em mãos uma obra rica. O pastor César Moisés brindou-nos com um texto que foi gerado ao longo das últimas décadas e que suscitou no próprio autor, via pesquisa e processo autocrítico, um amadurecimento de ideias e propostas singulares. A começar da apresentação da obra, em que o autor relata seu testemunho e deixa claro sua perspectiva, é possível vislumbrar a riqueza do conteúdo a partir do ethos pentecostal, que se concretiza à medida que avançamos na leitura dos capítulos. Na segunda parte, a reflexão está inserida em uma nova fase como o próprio autor indicou na aguçada introdução. Somos conduzidos a um clímax nessa reflexão mais ampla, que se mostrou um fio condutor ao longo da obra, como a guiar o leitor para passos mais ousados.

A teologia pentecostal brasileira está dando claros sinais de uma vitalidade e versatilidade incríveis. Durante muitas décadas, escutamos que os pentecostais não tinham teologia ou que sua leitura bíblica era meramente literalista e demasiadamente simplista. O jeito pentecostal estava fora dos cânones do típico protestantismo. Mas isso não quer dizer que não fizemos teologia antes. Ao contrário, era a forma de teologizar pentecostal que era negada por uma mentalidade exclusivista de labor teológico. Com o advento da pós-modernidade, outras formas religiosas tiveram voz e adquiriram espaço no cenário religioso nacional. Na verdade, a hegemonia de uma forma de fazer teologia foi definitivamente rompida.

Diante desse novo cenário, havia duas opções para os pentecostais. Uma era assimilar o jeito tradicional de fazer teologia baseado na tradição ou na ortodoxia reformada. Tal expediente estava demasiadamente dependente da cognição e de uma racionalidade cartesiana típica do ocidente. Com isso, os pentecostais que tiveram contato com o mundo da reflexão teológica se inclinaram a recuperar os clássicos como uma forma de identidade protestante. Nesse afã, redescobriam Calvino, Armínio e tantos outros, reaquecendo debates antigos da teologia. Tais controvérsias estavam no passado, mas para alguns ainda hoje é tema atual, como se isso fosse fazer teologia substancial. Cair nessa cilada é perder a oportunidade de fazer teologia relevante para nosso tempo. Além disso, essa maneira de fazer teologia não ajuda em nada o modo pentecostal de ser, pois não reconhece as categorias valiosas dos grupos pentecostais. Nesse sentido, os pioneiros pentecostais no Brasil tinham razão ao enfrentar uma educação teológica formalista que não contribuía para o exercício de uma pentecostalidade sadia.

A outra opção para os pentecostais é olhar para o nosso tempo, quer gostemos dele, quer não, e aprender a viver neste mundo. Em vez de se enclausurar em um gueto e ficar atirando pedras em tudo que diz respeito ao mundo pós-moderno, que possa discernir novos caminhos ou novas formas de ser no mundo. Nem voltar a um racionalismo reducionista nem assumir acriticamente os postulados da pós-modernidade. Trata-se de uma opção que exigirá discernimento. Por exemplo, a pós-modernidade valorizou a experiência como categoria, como critério de verdade. Logicamente as formas tradicionais de fazer teologia negarão a pós-modernidade nesse aspecto. Mas e os pentecostais? Não precisam negar. É justamente aqui, na experiência, no afeto, no sentimento, que o pentecostalismo melhor se expressa. Portanto, o pentecostal que nega a pós-modernidade sem mais, não estará fazendo teologia pentecostal, mas uma forma clássica de teologia. Não é pelo fato de ser um pentecostal que escreve que estamos diante de uma teologia pentecostal. Vemos muitos desses discursos hoje na mídia. Pentecostais deslumbrados com teologias datadas na história (relevantes no seu tempo, mas talvez ultrapassadas para hoje) dedicam-se a repetir os manuais de teologia. Fazer teologia exige pensamento crítico e criatividade. Como teólogos, temos responsabilidades com nosso tempo.

Este livro do pastor César Moisés é uma clara demonstração dessa segunda via. Profundo conhecedor da literatura sobre o tema — basta olhar as notas de rodapé e as muitas obras listadas na bibliografia —, descreve, critica e propõe, avançando de uma mera repetição de conteúdos para a fundamentação de uma clara posição. Esperamos que a leitura desta obra ajude os diferentes leitores/as a perceberem essa maioridade teológica pentecostal. Estamos avançando muito e rápido. Oramos para que novos autores se levantem no meio pentecostal e que sejam vozes criativas e bem fundamentadas, além de contribuírem para o fortalecimento da perspectiva pentecostal, não só para os pentecostais, mas também para os demais cristãos. O pentecostalismo já foi o “irmão mais novo” e dependeu muito de outras tradições cristãs. Mas agora o pentecostalismo amadureceu e também tem algo a ensinar aos demais irmãos. Afinal, somos todos instrumentos nas mãos do Espírito Santo. Que fale o Espírito por nosso intermédio neste novo mundo pós-moderno.

Pr. David Mesquiati de Oliveira

Doutor em Teologia (PUC-Rio), pós-doutor em Teologia (EST e PUC-Rio), docente da graduação e do Programa de Mestrado da Faculdade Unida em Vitória (ES), presidente e coordenador, no Brasil, da Fraternidade Teológica Latino-Americana (FTL), da Rede Latino-Americana de Estudos Pentecostais (RELEP), do Fórum Pentecostal Latino-Americano e Caribenho (FPLC), além de ser membro do Comitê Diretivo na FTL Continental, vice-coordenador continental da RELEP, membro do Comitê Geral do FPLC, líder da Assembleia de Deus, “Comunidade Glória”, em Vila Velha e secretário de Missões da Convenção Evangélica dos Ministros das Assembleias de Deus do Estado do Espírito Santo (CEMADES).

Fontes: Pentecostalismo e Pós-Modernidade – Quando a Experiência Sobrepõe-se a Teologia. César Moisés Carvalho. 1 edição, CPAD. Rio de Janeiro. 2017. Páginas: 17-19.

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